quinta-feira, julho 31, 2008

Verdade ou Ficção?

Era de madrugada.
Verão.
Não mexia uma folha.
Noite estrelada e sem nada a perturbar a imaginação de mundos distantes.
Nós estávamos agitados, tristes connosco próprios, desiludidos com o reflexo no espelho.
A vida tinha-nos açoitado e tinha sido uma vertigem junto ao abismo!
Mas, no carro, com jazz de trompete à Nova Orleães, em silêncio, ambos pequeninos, fomos vogando e paramos junto ao mar, num ermo escondido da estrada principal.

"- Quis vir aqui, por ser um lugar telúrico. Dá-me paz!"
Disse o meu Dono.
"- Sabes o que é telúrico?"
Abanei a cabeça a confirmar. Sentia-me uma esponja que tinha absorvido todas as más vibrações da nossa discussão anterior que seria a última. Sentia-me uma ameba. Sentia-me um ser esponjoso que nao conseguia pensar, só sentir - nada!
E o meu Dono começou a falar.
E eu ouvi e, devagar, começamos a dar uma coça na vida por nos ter atraiçoado...
A certo ponto ele sorriu e eu tive um lampejo de luz dentro da cova que era a minha alma da cor do breu.
Depois disse " - Agora vamos a outro sítio de paz!"
E lá me deixei levar por ele, antes da partida no dia seguinte, talvez a última partida.
O trompete insistia em rasgar os lençóis daquela madrugada só nossa - sem ninguém nas estradas nem a caminhar - e eu encolhia-me mais, com medo... muito medo... de ele ir embora na cauda de alguma estrela cadente!
Fomos andando e procuramos um monte famoso nas redondezas, donde se vê uma paisagem esplendorosa - de noite ou de dia - até ao mar, passando por cima de uma grande cidade iluminada.
Saiu do carro e chamou-me, vários cigarros depois do silêncio.
Fui.
Deu-me a mão e no largo dos moínhos caiados de branco e da capela em obras de restauro, circundamos o terreno em busca de mais enamorados duma madrugada de Verão. Suspiro. Estávamos sós. Ouviam-se ralas e pássaros noctívagos e morcegos em torno da luz. E os moínhos grandes e parados, sem vento e sem alma - como eu.

"- Este é outro sítio de paz!" - disse o meu Dono.
Tirara do carro a chibata curta e eu ia de vestido de praia curto, da cor dos meus olhos, e segui-o de mão dada.
Disse-me "Vê a paisagem, com as mãos apoiadas aí...."
E eu dobrei-me, devagar, no meio do silêncio das pessoas e da orgia dos bichos, e apoiei as maos no muro baixo e esperei.
As chibatadas começaram, espaçadas e a ecoar até ao mar, e eu perguntei ao meu Dono " - Está a castigar-me por hoje, ou só a ter prazer?"
"- Só a ter prazer!"
E continuou...
E eu olhava as luzes imensas e brilhantes no céu e na terra, de costas para Deus ou Cristo ou a Igreja, de rabo alçado e quente e dorido e pensei "pago os meus pecados, neste sitio de paz, em oferenda aos santos" e arrepiei-me.
Quando o Dono terminou, recuamos e ele encostou-se ao muro da igreja e pos-me de costas contra ele e só se roçou, como um gato deliciado...
Eu soltei-me, ajoelhei no paralelo e gravilha e disse de baixo para cima - "Perdoe-me meu Dono!"
E ele continuou em silêncio, mas tinha estrelas nos olhos, deu-me a mão e encaminhamo-nos para o carro...
"- Vamos para casa, terminar o que começamos!"




1 comentário:

JoaoDeAviz disse...

A magia do BDSM tem um lado assim

Às vezes é preciso ter o caos para criar a harmonia do universo.
Noite inesquecivel minina
;)