domingo, janeiro 21, 2007

O que escrevi antes é a resposta ao comment do post da Anais Nin!
Perguntam-me sobre libertação no BDSM...
Cada praticante de BDSM terá as suas razões inconscientes e subliminares para sentir a atracção do abismo da Dominação, submissão, Dor... Cada um falará por si. Eu falo por mim...

Quando o BDSM é um chamamento irrecusável e que nos dá comichão na palma das mãos e arrepios na coluna, sente-se a adrenalina do medo e pergunta-se: "Eu seria capaz...?"
Vai-se pensando e vendo fotos e filmes e marcas no corpo de outros que pensaram o mesmo, vê-se gente humilhada, cuspida, massacrada por impropérios e desprovida de dignidade, e pensa-se sempre o mesmo: "Eu seria capaz?..."
Depois, começa-se a tactear o próprio corpo à procura de outras vertigens, com imagens nos olhos e na cabeça, começa-se a beliscar mamilos e a ouvir palavrões ao ouvido. E sempre a pensar "Eu seria capaz...?"
Um dia, se tivermos sorte, alguém atento percebe que a virgindade corrompida do desejo baila no fundo das frases e dos olhares e que há um fruto maduro a colher.
Se tivermos azar, um/a qualquer idiota convencido/a que percebe de gente e de alma e de sentimentos, ataca em várias frentes e convence-nos que somos para usar e deitar fora - vítimas das circunstâncias, apenas.

Mas quando se sente o apelo de vôos ousados e de grilhetas a arrastar desde sempre, ainda que sem nome, seja de quem for que se aproxime com a mesma identidade, sente-se o cheiro no ar e as narinas dilatam. Reconhece-se um igual, um par, um companheiro de armas na mesma cruzada. Faz-se a corte e juntos procuram crescer nas mãos do outro. Começa o fogo de artifício do fazer e do sentir, e as entregas degladiam-se em jogo de titãs - jogo de tudo ou nada, dar ou receber, ficar ou partir.

Em mim, dentro da concha do que sinto, a libertação faz-se de dentro para dentro, e exuda-se em marés de contentamento calado mas reconhecido. Cresço de cada vez que sofro por Amor - não, não me enganei, Amor - o que faz qualquer entrega real e completamente altruísta até ao ponto de não-retorno.

É preciso ser muito livre e muito gente para decidir explorar o sentir de dores maiores e alegrias maiores às mãos de alguém; é preciso ser muito livre para se deixar aprisionar! Amar é prisão! Liberdade é prisão! Estar preso por amor é Liberdade!

Dei recentemente uma entrevista em que me perguntavam se algum dia deixaria de praticar BDSM, se sairía do seu plateau...
Respondi: "No dia em que me sentir violentada, salto fora...!"
Isso acontece no dia em que percebo que a libertação acabou, o amor acabou e já não sinto comichão na palma das mãos...



As dores do parto do nado-morto que se escondeu na memória, as grilhetas da saudade e do adeus - a vida que escorre dos olhos tristes da prisioneira da vontade, a libertação que se solta em cada nó. Silêncio, tanto silêncio. Chove dentro e fora do corpo. Raiva muda e cega e surda que escorre por amor. A dor!

Homenagem a Mário de Sá-Carneiro / A Dor Que Cai dos Olhos

Quase

Um pouco mais de sol - eu era brasa.
Um pouco mais de azul - eu era além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém......

Num ímpeto difuso de quebranto,
Tudo encetei e nada possuí...
Hoje, de mim, só resta o desencanto
Das coisas que beijei mas não vivi...

Fim

Quando eu morrer batam em latas,
Rompam aos saltos e aos pinotes,
Façam estalar no ar chicotes,
Chamem palhaços e acrobatas!
Que o meu caixão vá sobre um burro
Ajaezado à andaluza...
A um morto nada se recusa,
E eu quero por força ir de burro.

terça-feira, janeiro 16, 2007

"I do not want to be the leader. I refuse to be the
leader. I want to live darkly
and richly in my femaleness. I want a man
lying over me, always over me. His
will, his pleasure, his desire, his life, his work, his sexuality the
touchstone, the command, my pivot.
I don't mind working, holding my ground intellectually, artistically; but as a woman, oh, God, as a woman I want to be dominated. I don't mind being told to stand on my own feet, not to cling all that I am capable of doing but I am going to be pursued, fucked,
possessed by
the will of a male at his time, his bidding."


Anais Nin

segunda-feira, janeiro 15, 2007

EXPOSTA!!!!!!!!!!!

Começo por pedir desculpa pela ausência, mas à medida que os anos passam, os dias parecem ficar mais curtos e mais preenchidos por mil e uma coisas...
Comigo, muita coisa tem acontecido e pouco tempo resta para o que muitas vezes acaba por ser o mais importante - partilhar!
Quem vem a este blog há anos sabe que acredito na partilha e que sempre tentei manter um fio condutor coerente, o que volta a acontecer agora.
Vou partilhar um momento especial na minha vida de submissa com Dono...

Tive uma Passagem de Ano diferente e especial.
Noutras, assisti a práticas BDSM "públicas" (em círculo de amigos); nesta, estive no centro do círculo, a servir orgulhosamente o meu Mestre.
Confesso que receei durante anos este momento, porque nao é do meu feitio ser exposta publicamente em BDSM, mas tenho de admitir que sempre desejei ultrapassar essa fronteira entre a timidez e o medo de ser olhada pelos presentes - coisa minha desde criança...
Mas também soube sempre que mais que o "medo" é a ideia do medo que nos apresenta os fantasmas pela mão e nos faz tremer, e também sempre tive consciência que algué,m um dia, ao apresentar-me o facto e não a teoria, conseguiria desinibir-me...
E aconteceu, e foi simplesmente fantástico e não tive qualquer medo ou receio ou pudor, porque no momento estive apenas com o meu Mestre, em entrega dirigida e consentida.
Se alguém pensa que é possível descrever o que sente uma submissa ao ser o alvo das atenções "públicas" porque nas maos do seu Mestre, desengane-se; é algo forte, íntimo, pessoal e indescrítivel - é quase ser "heroína" num momento referenciado no Tempo. Ser tornada especial ao dar tudo ao Mestre, fazendo-o especial nessa entrega...
Deixamos de ser "two lost souls swiming in a fish bowl" (Pink Floyd) e tudo passa a fazer sentido - aquelas pessoas, aquele momento, aquele espaço, aquela janela na vida - um "instantaneo"da alma, ou das almas, porque somos dois a dar e a receber...

De dentro da minha jaula de devoção, levantava os olhos devagar, a subir, na direcção do Mestre...
Não estava sózinha, mas encontrava-me na espiral de duas entregas, animal enjaulado na minha escolha primeira...
Pela trela, em silêncio, sem estretor nem pensamentos, levitei de dentro de mim até às mãos confortadoras do Mestre, e deixei-me ir. Cresci, a imaginar como a plateia nos olhava enquanto Mestre e marioneta, pois os olhos estavam cegos pela vontade do Mestre...
Confiei nele, sem uma palavra antes, que indiciasse que me mostraria exposta aos olhos famintos de uma inveja saudavel...
Fiquei amarrada ao desejo do Mestre e a outro submisso pela mao da sua Senhora, e só ouvia o bater do coração dele no peito, que ecoava das batidas do meu...
No fim, mais crescida, mais exposta e mais submissa, o Mestre fez-me ajoelhar a seus pés, pela trela, e acariciava-me a cabeça, cansado mas firme. E eu fiquei ali nos seus joelhos, entregue, feliz e a sentir-me mais sua como nunca antes!
BDSM é isto - adultos a crescer na palma das mãos, em silencio...