segunda-feira, novembro 29, 2004

A mulher rendida!

Nem olhava...
A mulher dentro do corpo ficava ali,
Braços caidos, cabeça pendente
A olhar
Nua
A esperar...

Viajava,
Entre partidas e chegadas,
Inocente na sua demência dum vôo rasante
Por um qualquer telhado...

A mulher enclausurada
Que descia do céu,
Todas as vezes que respirava fundo
Encolhia-se ao medo,
E espreguiçava-se
Numa onda de volúpia
Sempre que fechava os olhos!

Num qualquer beco sem saida
Rendia-se,
E ficava solitariamente acompanhada
À espera de novo sol
Ou
que uma qualquer asa de pássaro livre a libertasse.
A mulher, rendida, nua, de braços caídos e cabeça pendente!


ML

O que é o Amor?

“Neste momento, ergueu os olhos que conservava baixos para as papoilas e reparou que Sir Stephen fixava os seus lábios. Escutá-la-ia ou só estaria atento ao som da sua voz, ao movimento dos seus lábios? Calou-se bruscamente e o olhar de Sir Stephen subiu e cruzou o seu próprio olhar. O que leu nele desta vez era claro, e tão claro para ele o que ela tinha lido, que foi a sua vez de empalidecer. Se ele a amava, perdoá-la-ia por ter percebido? Ela não podia afastar os olhos, nem sorrir, nem falar.
Se ele a amava, o que teria mudado? Poderia ser ameaçada de morte que permanecia igualmente incapaz de um gesto, incapaz de fugir, os joelhos não lhe teriam obedecido. Sem dúvida, ele não quereria nada mais do que submissão, ou o seu desejo, que, desde o dia em que René a entregara, bastava para explicar que ele a reclamasse e a retivesse cada vez mais, algumas vezes só pela presença, sem nada lhe pedir.(...)
Sir Stephen começou por lembrar que, na primeira noite em que ela fora a sua casa, lhe dera uma ordem à qual não obedecera, e observou que, embora a houvesse esbofeteado, não renovara depois a ordem. Conceder-lhe-ia no futuro o que lhe tinha recusado? O compreendeu que era necessário não só aquiescer, mas que ele queria ouvir da sua boca, em termos apropriados, que sim, que ela se acariciaria todas as vezes que lhe pedisse. Ela disse-o, e tornou a ver o salão amarelo-cinza, a partida de René, a sua revolta da primeira noite, o fogo que brilhava entre os seus joelhos separados quando se deitara nua no tapete...”

In “História de O”
Pauline Réage

sexta-feira, novembro 26, 2004

A Homossolidão

“A maioria dos estudiosos de Sociologia concorda que, para as sociedades em geral, a realidade é aquilo que que o senso comum, o consenso, diz que é. Assim, quando alguém ousa pensar ou sentir de forma diferente daquela que a sua sociedade considera “a realidade”, passa a sentir a ansiedade do isolamento, e daí resulta o medo e as suas consequências. Etric Fromm, diz que no âmbito não-biológico, mas psicossocial, não é o medo da morte que constitui a grande sombra, mas sim o medo da loucura.”

In “Solidão Nunca Mais” (2003)
Roberto Bo Goldkorn

segunda-feira, novembro 22, 2004

"No sentido macropsicológico, a homossexualidade é narcisista e, portanto,alimenta a solidão fundamental.Por mais avançada que esteja a nossa sociedade, montanhas de tabus e preconceitos ainda pesam sobre quem escolheu amar o mesmo sexo. Como é possivel ser-se feliz remando contra a corrente social?"


domingo, novembro 21, 2004

Momentos que nem momentos são!

Às vezes, o Tempo pára... e tudo parece mudar de lugar!
Fazem-se quilómetros, muda-se de sítio, muda-se de pele, e tudo permanece igual...
Às vezes, é muito difícil saber o que se anda a fazer, outras vezes não! Decidir doi, porque um erro muda tudo...
Odeio arrepender-me, odeio a sensação azeda do arrependimento, do perder das causas perdidas. As contradições alimentam a alma mas esvaziam o coração, e ele é tão grande e tão mal atafulhado de coisas supérfulas que acabamos por não saber o que meter lá! O que cabe lá...
Às vezes, a vida é outra, e fingimos o que não somos... às vezes, que outras não.
Muitas vezes, nada parece fazer sentido! Outras vezes, ficamos de mãos vazias, mas crispadas, porque nos roubam o que não chegamos a ter! Demasiadas vezes, nem temos força para cerrar os punhos, e ficamos ali, de braços caídos, qual árvore à espera do corte antes do Outono...
E há momentos em que nem sequer esperamos! Há momentos que nem momentos são... Há....

ML

segunda-feira, novembro 08, 2004

Diferente, uma coisa preciosa…

“(...) Só na sexualidade é que o milionésimo de diferente aparece como uma coisa preciosa, porque não é publicamente acessível e tem de ser conquistado. Ainda há meio século, este tipo de conquista exigia que se lhe dedicasse muito tempo (várias semanas e, às vezes, alguns meses) e o valor do objecto conquistado era proporcional ao tempo consagrado à sua conquista. Mesmo nos dias que correm, embora o tempo da conquista tenha diminuído consideravelmente, a sexualidade é para nós como que o cofrezinho das jóias onde se encontra guardado o mistério do eu feminino.
Não era, portanto, de forma nenhuma, o desejo da volúpia (a volúpia aparecia por assim dizer como brinde), mas o desejo de se apoderar do mundo (de abrir com o bisturi o corpo jazente do mundo) que o fazia andar atras das mulheres.”

In “A Insustentável Leveza do Ser” (1983)
Milan Kundera


segunda-feira, novembro 01, 2004

“Vê se consegues convencêr-me!...”

“(...) Para colher informações acerca de um homem, a mulher precisa de o sujeitar a vários testes. Dependendo da forma como ele responde, quando comparado com outros candidatos disponíveis, ela poderá aceitá-lo ou rejeitá-lo. A mulher precisa de encontrar testes que constituam um desafio, mas que não sejam impossíveis de realizar. Perderão o valor, se forem ou demasiado fáceis, ou tão difícieis que homem algum os consiga resolver. O corpo da mulher e o seu comportamento foram moldados para funcionarem como teste. E, muitas vezes, ao testar as qualidades do homem, o que ela está realmente a testar é a capacidade dele para aprender a usar o seu corpo e a cooperar com ela. Aprender é sempre uma tarefa difícil quando a um dado comportamento não corresponde sempre a mesma resposta. A resposta da mulher a qualquer estímulo masculino é notoriamente imprevisível. Isto é verdade para os primeiros momentos de aproximação que precedem o orgasmo durante o coito. Não só existem diferenças de mulher para mulher (por razoes plausiveis), como existem diferenças individuais de ocasião para ocasião (também por razoes plausiveis) (...)

(...)O sexo grosseiro e violento é um elemento comum do “namoro” quer dos homens, quer dos animais, quando decidem fazer ou não sexo. Tal comportamento tem muitas facetas, e todas implicam um intermezzo entre a selecção de machos pela fêmea e a exibição de atributos pelos machos. As fêmeas fazem aos machos testes de força física e de competência sexual que os homens conseguem ou não ultrapassar. No evoluir do processo reprodutivo, o uso do sexo grosseiro e violento pode trazer benefícios para a mulher – e o desempenho satisfatório pode igualmente favorecer o homem.
A maior parte das vezes, estes jogos de grosseria e violência acontecem sem qualquer dano para os dois parceiros: a mulher obtém a informação que deseja e o homem, se o seu desempenho for satisfatório, pode conseguir uma relação sexual. Porém, ocasionalmente, tais jogos podem ser perigosos. Dos jogos de grosseria e violência com consentimento mútuo até à violação, vai um pequeno passo. De facto, quando um homem força uma mulher a ter relações sexuais com ele, e ela o acha quando muito, interessante para beijar ou lhe permitir certas intimidades, é quase uma violação. Embora não a violação predatória, fortuita... Em princípio parece fácil estabelecer um limite claro entre o acto sexual grosseiro e violento e a violação feita por um conhecido. Se a mulher diz “não” e de qualquer modo o homem a força, nesse caso é violação. No entanto, como vemos pelo tratamento do problema pelas legislações mundiais, não é assim tão simples.Um dos muitos problemas consiste em que, sob muitos aspectos da vida, as pessoas dizem “não”, quando na realidade querem dizer “Vê se consegues convencer-me!” (...)”

In “As Guerras do Esperma” (1996)
Robin Baker