Frequento Foruns e canais de IRC de BDSM há uns anos.
Quando entrei neste mundo paralelo, o frescor da inocência em tudo era o que me movia...
Depois, como em tudo na vida, começamos a assinar declarações de intenções e de factos, e sem sabermos como, já fazemos parte da engrenagem. Dá-se a desilusão e o recuo, o repensar das coisas, o querer isenção... mas é tarde demais. Sem percebermos, já lá estamos e já fazemos parte do
puzzle, das mesquinharias e das tonterias e das intrigas; não compactuámos, mas estivemos lá e assistimos e isso faz de nós cúmplices sem retorno.
No começo achava que me conseguiria manter àparte e fiz de tudo para que assim fosse, mas não é possível. A vida e as sub-vidas da vida obrigam-nos a compromissos e à tomada de atitudes, e o que é a nossa conciciência não é uma consciência colectiva.
Hoje perguntaram-me "desencantada?"... e hesitei.
Sim, desencantada pela realidade geral e não pela da gente em torno do BDSM e dos seus meandros mais sórdidos; desencantada com a vida e a gente, comigo e com o que nao faço e com o que faço. Sei que vou continuar em frente, estou de olhos secos e não é muito grave; acho que de cada vez que uma tomada de consciência nos assola se torna mais fácil porque de cada vez é mais previsível. Não estou triste, só sem saber o que fazer quando percebemos que nos estamos a tornar Sanchos Panças a acompanhar Dom Quixotes sem
Rocinantes...Não mudava uma linha na minha vida, excepto numa situação fora do BDSM.
Mas usava mais sinónimos e menos metáforas, fazia menos romance com dias de borrasca que são o que são - dias de borrasca! Não queria voltar atrás, mas gostava de avançar rapidamente.
Descobri que depois dos 40 a vida só é miserável porque nunca mais surpreende, um ciclo de
dejá vus e de coisas aquecidas insiste em instalar-se
ad eternum. Odeio rotinas. Odeio vidas cheias de rotina. Gente sempre igual. Eu, sempre igual...
Enquanto acreditamos vale a pena, mas depois, como rotular esta permanente, insofismável e quase patética leveza do ser? Porque insustentável sempre soube que era! Mas porque tem o ser de ter leveza?
O BDSM dá-me paz. Uma paz séria e compacta. Não uma paz mole, de faz-de-conta. O BDSM deixa-me ser como sou - liberta-me numa viagem dos sentidos e da alma; ganho alma com consistência, quase com cheiro e textura. Renasço em cada dor e em cada ordem cumprida, em cada humilhação que aguento, em cada silêncio de garganta fechada; sinto-me feliz por não estar triste e atenta ao que se passa fora de mim, dou prazer a quem me Domina, sendo, ao deixar de ser... As funções todas cumpridas e os sonhos todos ao rubro. A volatilização.
E nunca o ser foi tão leve...!