sábado, fevereiro 12, 2005

Um labirinto de certezas!

Nem sempre as coisas são óbvias, qualquer que seja a coisa em qualquer que seja o tempo e o espaço... Por vezes as dúvidas são necessárias para chegar às certezas, então legitimadas, quando antes sistemáticas, reflexas e sem peso.
No reino do BDSM, nem sempre toda a gente sabe o que anda a fazer, se quer fazer, ou porque o faz!
Recentemente, alguém me dizia que tinha rejeitado um convite de escrava dum Dominador, por o querer servir por inteiro, como ele merecia. Parece contraditória a questão e a solução, mas não é! Quando li o e-mail com a sua resposta, desejei ter sido eu a escrevê-lo, e fiquei certa de que o Dominador em questão se sentiu deveras realizado! A Dominação não se faz na carne, mas dentro dela... O chicote só faz saltar as lágrimas. O contentamento é sentir o Senhor crescer nos nossos olhos!


“Tenho pensado na eventualidade que me colocou, sem saber bem o que pensar... Aparentemente, sentir não chega!
Desde que falei consigo ao telefone pela primeira vez que confiei em si, desde a nossa primeira sessão que sabia que seria "o tal" Dominador; desde há muito, portanto, que me entreguei a si!
Confesso que imaginei muitas vezes o quanto gostaria de ser sua escrava, que vezes demais usei a imaginação para uma excitação plena consigo como meu Dono, etc... No entanto, depois lembrava-me que "não era livre" por compromisso assumido, e afastava qualquer esperança nesse sentido. Quando há tempos falou na hipótese pela primeira vez fiquei em puro êxtase, e ontem repetiu-se a primeira sensação. Não havia nada que me desse mais prazer... julgo que merecia ouvir isso. Trocámos sms e fiquei com as mãos cheias de coisas e definições, mas infinitamente confusa. Hoje passei o dia a pensar e a repensar, e a sentir muito, demais... uma angústia. Ontem disse-lhe que me desagradava a ideia do segredo (embora compreenda que seja necessário), que nunca me escondi... Continua a ser verdade!
Nada me faria mais feliz no BDSM do que ser sua escrava... mas sem me ter de esconder! Entendo que, por definição, uma escrava só existe enquanto criação do seu Dono - se essa relação vive no segredo, a submissa nunca existirá. Não posso matar, esconder, amarfanhar, uma submissa que se quer entregar por inteiro a quem lhe dê a hipótese de existir.
Sobre o conceito de heróis no BDSM, defendo sermos todos nós na comunidade; toda a gente quer ser herói por umas horas, ter os seus quinze minutos de fama, imaginar-se uma excelente submissa ou o melhor Dom de todos...
Uma submissa em segredo é uma violência, quase uma violação, porque tudo o que quer é dizer o seu Dom um herói - o melhor de todos! Toda a submissa sonha em ser apresentada pelo seu Dono como a sua cadela, a sua coisa, em ser emprestada por ele a outro Dono ou a entrar numa gathering/encontro/workshop acompanhada por quem tenta honrar! É o reconhecimento dele à entrega dela, penso eu, enquanto enaltecendo o seu Dono ele a premia com a sua presença pública...
Sempre lidei mal com o segredo... E neste caso ele mataria a alegria de o ter como Dono, por me fazer deixar de existir - anular-me para lhe dar prazer é uma coisa, nem chegar a existir é o castigo antes da ofensa. Os submissos também querem ser heróis, terem os seus quinze minutos de fama - sentirem-se invejados por o seu Dono ser o melhor, cumprimentados no plurar, considerados um apêndice do Dom X... Acho que preciso disso e conheço-me bem - conseguia fingir que concordava, mas nunca seria o mesmo! Ia olhar para si e em silêncio tentar perceber porque não tinha um Dono que me assumisse, sempre.
Ia ficar triste, cumprir exemplarmente as suas ordens, mas também sentir-me abandonada no anonimato... Sei que não iria sentir prazer e duvidaria da entrega, porque seria a tristeza a dominar-me, não o Senhor.
Resumindo, ficaria muito feliz se um dia me convidasse para sua escrava, e assim fiquei com a hipótese... imensamente contente com a possibilidade de o agradar enquanto meu Dono. Mas seria uma farsa que nesses moldes me empobreceria como submissa, e não o quero desonrar com uma representação... Talvez seja uma excelente actriz se necessário, mas não o quero fazer, muito menos consigo!
E, de um modo muito prosaico, já o estou a honrar e a servir...Se quiser continuar a ter-me em sessões sem fingimento serei sempre sua submissa sem interferir com o seu caminho, desde que isso lhe baste e lhe dê igualmente prazer. Se não fôr o caso, entendo.... em absoluto! Não o rejeito - apenas não me quero dar pela metade!E honro-o
assim... como posso! Não como quero!...

Um beijo dado de olhos baixos!
Uma submissa...”

4 comentários:

Anónimo disse...

O BDSM e algo que existe porque existem pessoas e estas sempre são reais.
Dai que o mundo sempre seja o real, para o bem e para o mal.

Sobre o texto que dizer senão… Feliz o Mestre que tão bela submissa tem!

Contudo uma reflexão sobre o raciocínio da submissa (não do dela que compreendo e aceito naturalmente, mas sobre a universalidade que tenho vindo a ver ser assumido).

O limite de uma relação é sempre a que cada grupo de intervenientes quiser e desejar. O jogo numa relação D/s pode ser intenso entre duas pessoas mesmo que mais ninguém o conheça. E isso pode ser por decisão própria e não fruto de “necessidades praticas”.

A intensidade dos jogos não é determinada pelos outros mas somente pelos próprios

naodigo disse...

ao post:

sem duvida, sorte do que conseguir tal escrava... não é toda a gente que se consegue entregar assim...
espero que todo o assunto acabe em bem:)

A Gipsofila
"A intensidade dos jogos não é determinada pelos outros mas somente pelos próprios "

nem a intensidade, o numero ou o tipo de jogos deve ser apena influenciado pelas pessoas em questão, os seus desejos e sentimentos... e haja respeito por todos... um grande regador bem cheio de agua :)

Anónimo disse...

Não será talvez o local ou o tempo certo para uma história. Sou, por natureza desconfiado e o convívio naõ me fez melhorar. Pelo contrário. Enquanto Senhor de uma escrava, sinto prazer em merecer a sua entrega. Várias vezes me interroguei sobre o que leva uma pessoa, homem ou mulher, a entregar-se assim, como objecto de prazer do outro. Poderia inemerar um chorrilho de banalidaeds tantas vezes repetidas; gostaria de dominar melhor a psicologia humana para o entender plenamente. Não faço nada disto. Limito-me a contemplar o que sucede, extraindo o máximo daquela dávida. Não sou um apreciador do castigo físico. Não quero correr o risco de transformar uma escrava numa masoquista. O castigo tem de se manter como tal sem nunca passar a ser a causa do prazer. Mas este sou eu. Outros pensarão de forma diversa. Pessoalmente prefiro o castigo psicológico, quantas vezes mais duro que o físico. E assim vou recriando um ser á minha medida. capaz de entender os meus mais pequenos desejos sem necessidade de os verbalizar. Talvez exista amor do lado dela (o meu lado desconfiado); por mim, sei que estou a tentar que ela seja perfeita, pelo mnos para mim, na certeza de que, um dia, porque nada dura para sempre, outro irá talvez aproveitar o treino que lhe agora lhe proporciono. Postas assim as coisas, direi que, uma vez que não procuro no bondage e na disciplina uma desculpa para sexo casual, a relação entre Senhor e escrava se baseia sobretudo na confiança e na necessidade. Confiança e necessidade de ambos. E se sobre a confiança me dirão que é sobretudo quem se entrega que tem de a sentir, em relação há necessidade julgo que é de ambos. Ele não existe sem ela; ela precisa dele para ser. E cada aula (abomino a palavra sessão), cada encenação, serve para engradecer a alma e apaziguar os sentidos. E todos os dias há coisas novas para ensinar e para aprender.

naodigo disse...

Paterlomio,

gostei de te ler.
Tal como tu não gosto da palavra "sessão". para ser sincero nem do conceito gosto muito... Considero que uma verdadeira D\s, é prejudicada pelo conceito de "sessão" em que por muitas vezes a entrega e submissão só existe naquele momento... Quando deveria ser a "razon d'etre" da relação, e não uns momentos agradáveis na semana.. ou no mês...
pois a Entrega... a Entrega de sub para Dom e de Dom para sub só pode e consegue verdadeiramente desabrochar quando é vivida fora da "sessão"... digo eu...:)

um abraço